terça-feira, 1 de abril de 2014

É chato ser adulto, né?!

Há umas semanas, encontrei um amigo na parada do ônibus na volta pra casa. Olhei bem para ele e não tive dúvidas ao perguntar se algo estava acontecendo.

— É chato ser adulto, né?

Passei uns dois minutos tentando processar o que ele quis dizer, enquanto lembrava de quando eu era pequena.

Quando cheguei na alfabetização, em 90% do tempo, a frase que mais saia da minha boca era: "Porque quando eu for primeira série...". Cheguei na primeira série e ela se tornou: "Porque quando eu for quarta série...". Ao chegar na quarta, era: "Porque quando eu for quinta série...". Na quinta, oitava; Na oitava, primeiro ano; No primeiro, terceiro; No terceiro, faculdade.
Ainda sentada no chão de uma sala iluminada apenas pela luz da lua que invade uma falha na persiana (você sabe, todas as cortinas desse tipo vêm com falhas. Já deixou de ser um defeito de fabricação e se tornou uma característica), vasculhando as várias pastas organizadas por categoria, ano, dia e relevância - já que eu acredito que o "setor" de memórias na nossa cabeça nada mais é que um daqueles escritórios policiais de filmes, onde alguém sempre invade no meio da madrugada, abre aqueles móveis enormes de arquivos e mexe em todos os casos organizados em ordem alfabética até encontrar o que lhe interessa - de recordações da minha vida, lembrei que, quando pequena, eu queria ser e fazer tudo o que eu sou e faço agora.

Eu praticamente implorava para que minha mãe me deixasse lavar a louça. Tinha prazer em pagar as contas do meu pai - com o dinheiro dele, é claro -; Brincava de trabalhar, de arrumar a casa, de me apaixonar... Andava o centro da cidade todo a pé com a minha mãe e ficava imaginando como seria mágico quando eu crescesse e fosse resolver minhas próprias coisas sozinha ou como eu me sentiria o máximo por saber pra onde cada um dos milhares ônibus poderia me levar. 
Aí o tempo passa, você pula de série em série, começa a ter que lavar a louça por obrigação, trabalhar de verdade (e muito! No meu caso, enfornada e engomada em um escritório de banco) pra ganhar o seu próprio dinheiro e ir, sozinha, andar no centro da cidade para pagar as suas próprias contas - depois de calcular qual dos milhares ônibus te levaria mais rápido ao seu destino, considerando o local, o horário do ônibus e, principalmente, o trânsito que vai estar congestionando as avenidas pelas quais quais ele passa.

Há um minuto atrás você era uma criança cuja maior preocupação era chegar a tempo de assistir "camundongos do campo e da cidade" e fazer o dever de casa para tirar notas boas e assim conseguir ser o que você sonhou para o seu futuro. Aí a vida adulta te acorda do seu sonho, acende a luz do quarto, desliga o ventilador, puxa seu pé, seu cobertor (ou essa seria a minha mãe?) e te obriga a ir viver a sua vida de adulto-que-sai-de-casa-de-manhã-cedo-e-só-volta-às-22h-após-a-faculdade. Seria bonito dizer que agora vamos descobrir os "prazeres" da vida, os caminhos que queremos seguir, nos descobrir, nos permitir, abrir as asas e soltar as feras, mas o negócio não é bem por aí não, meu amigo.

— Verdade - respondi, voltando a mim enquanto dava sinal para o ônibus — ser adulto é um saco.